Na revista eletrônica The American Scholar (Winter 2010), Priscilla Long escreve o artigo My Brain on my Mind em forma de um ABC, onde a última palavra de cada verbete é o mote, o ponto de partida para o próximo. O tema flutuante da autora são suas lembranças do avô atingido pela senilidade. Não é um texto estritamente científico ou literário: mistura esses dois ingredientes na medida certa, e nos permite vislumbrar a delicadeza e a maravilha da integração mente-cérebro. Leia, indo do B (de 'brain', cérebro) ao C (de 'consciousness', consciência):
B
"(...) Lá está seu cérebro: uma massa de um quilo e meio de neurônios, pulsos elétricos, mensageiros químicos, células de glia. E aqui está base biológica da mente. 'Qualquer coisa pode contecer', diz o poeta C. D. Wright, 'nas estranhas das cidades da mente'. E seja lá o que aconteça - qualquer pensamento, disposição de ânimo, música, percepção, ilusão - nos é dado por essa bolsa pulsante de células e substâncias cerebrais. Mas, então, o que a consciência?
C
A consciência, de acordo com os neurocientistas Francis Crick e Christof Koch, é 'atenção multiplicada por memória de trabalho'. Sendo que 'memória de trabalho' é aquele tipo de memória que grava aquilo em que v. está prestando atenção agora. Acrescente à 'atenção multiplicada por memória de trabalho' um terceiro elemento da consciência - o senso do Eu enquanto distinto do objeto da percepção. Se estou consciente de alguma coisa, eu a 'sei', eu a 'percebo'. Como diz o neurobiólogo Antonio Damasio em The Feeling of What Happens, 'A consciência vai além de estar desperto e alerta: ela exige um senso interno do eu no ato do conhecimento' (Ela também requer o neurotransmissor acetilcolina).
Existe uma outra teoria da consciência, a teoria da consciência da física quântica, na qual os quarks, partículas fundamentais, têm protoconsciência. Diz-se que essa teoria tem um problema de agregação - como é que zilhões de partículas protoconscientes formariam um ser consciente? Ela coloca a consciência externamente a formas de vida e no interior de rochas da lua e de colheres. Vou deixar essa teoria por aí mesmo.
No sono sem sonhos, não estamos conscientes. Sob anestesia, não estamos conscientes. Andando pela rua atordoados, mal estamos conscientes. A consciência pode envolver o que o neurocientista Jean-Pierre Changeux postula como 'espaço global de trabalho' - um espaço metafórico de pensamento, sentimento e atenção. Ele acha que é criado pelo disparo de grupos de neurônios originados no tronco encefálico, cujos axônios extra-longos se espalham para cima e para baixo, para frente e para trás através dos dois hemisférios, conectando-se reciprocamente com neurônios do tálamo (estação de religação sensorial) e do córtex cerebral. Esses neurônios estão concentrados na atenção, recebendo novidades sensoriais e as avaliando, reprimindo o irrelevante, reativando circuitos da memória de longo prazo e, comparando o que é novo com o que já é sabido, registrando um senso percebido de 'satisfação' ou de 'verdade', que é introduzido por uma sobretensão do sistema de recompensa (principalmente com dopamina).
Entretanto, Crick e Koch propõem que a parte de nossa matéria cinzenta necessária para a consciência é o claustrum, uma estrutura plana como uma folha de papel localizada nas profundezas do cérebro, em ambos os lados. Olhado de frente, ele tem mais ou menos a forma dos Estados Unidos. Esse claustrum mantém conexões ativas com a maioria das outras partes do cérebro (necessárias para qualquer papel condutor). Ele também tem um tipo de neurônio que lhe é interno, capaz de despertar junto com outros de seu tipo e disparar sincronizadamente. Esta pode ser a maneira do claustrum de criar coerência a partir da cacofonia informacional que passa através dele. Porque a consciência se sente coerente. Não se importe se seu cérebro está nesse momento processando um zilhão de bits diferentes de dados.
A teoria da consciência (global) de Gerald Edelman considera a consciência como resultado da atividade neuronal por todo o cérebro. Edelman (juntamente com Changeux e outros) aplica a teoria da evolução a populações de neurônios. Iniciando-se bem cedo no desenvolvimento do indivíduo, a ativação de neurônios e sua conexão com outros neurônios formam populações que se modificam à medida que interagem com inputs do meio ambiente. O sistema de recompensa do cérebro faz a mediação que determina que populações sobreviverão como as mais aptas. A teoria de Edelman cita o fato de que não existem dois cérebros exatamente iguais; mesmo gêmeos idênticos não têm cérebros idênticos.
Como é que, no esquema de Edelman, a consciência obtém sua coerência? Através da recirculação de sinais paralelos. Se v. é um neurônio, v. recebe um sinal, digamos, de uma onda de luz, então o retransmite para o próximo neurônio através de um pulso elétrico. Imagine fogos de artifício, uma explosão no céu noturno. Diferentes grupos de neurônios registram a luz, a forma, o estouro sonoro. Depois de receberem seus respectivos sinais, as populações de neurônios os repassam à frente e à retaguarda para outras populações de neurônios. O que emerge é uma gloriosa explosão estelar".
B
"(...) Lá está seu cérebro: uma massa de um quilo e meio de neurônios, pulsos elétricos, mensageiros químicos, células de glia. E aqui está base biológica da mente. 'Qualquer coisa pode contecer', diz o poeta C. D. Wright, 'nas estranhas das cidades da mente'. E seja lá o que aconteça - qualquer pensamento, disposição de ânimo, música, percepção, ilusão - nos é dado por essa bolsa pulsante de células e substâncias cerebrais. Mas, então, o que a consciência?
C
A consciência, de acordo com os neurocientistas Francis Crick e Christof Koch, é 'atenção multiplicada por memória de trabalho'. Sendo que 'memória de trabalho' é aquele tipo de memória que grava aquilo em que v. está prestando atenção agora. Acrescente à 'atenção multiplicada por memória de trabalho' um terceiro elemento da consciência - o senso do Eu enquanto distinto do objeto da percepção. Se estou consciente de alguma coisa, eu a 'sei', eu a 'percebo'. Como diz o neurobiólogo Antonio Damasio em The Feeling of What Happens, 'A consciência vai além de estar desperto e alerta: ela exige um senso interno do eu no ato do conhecimento' (Ela também requer o neurotransmissor acetilcolina).
Existe uma outra teoria da consciência, a teoria da consciência da física quântica, na qual os quarks, partículas fundamentais, têm protoconsciência. Diz-se que essa teoria tem um problema de agregação - como é que zilhões de partículas protoconscientes formariam um ser consciente? Ela coloca a consciência externamente a formas de vida e no interior de rochas da lua e de colheres. Vou deixar essa teoria por aí mesmo.
No sono sem sonhos, não estamos conscientes. Sob anestesia, não estamos conscientes. Andando pela rua atordoados, mal estamos conscientes. A consciência pode envolver o que o neurocientista Jean-Pierre Changeux postula como 'espaço global de trabalho' - um espaço metafórico de pensamento, sentimento e atenção. Ele acha que é criado pelo disparo de grupos de neurônios originados no tronco encefálico, cujos axônios extra-longos se espalham para cima e para baixo, para frente e para trás através dos dois hemisférios, conectando-se reciprocamente com neurônios do tálamo (estação de religação sensorial) e do córtex cerebral. Esses neurônios estão concentrados na atenção, recebendo novidades sensoriais e as avaliando, reprimindo o irrelevante, reativando circuitos da memória de longo prazo e, comparando o que é novo com o que já é sabido, registrando um senso percebido de 'satisfação' ou de 'verdade', que é introduzido por uma sobretensão do sistema de recompensa (principalmente com dopamina).
Entretanto, Crick e Koch propõem que a parte de nossa matéria cinzenta necessária para a consciência é o claustrum, uma estrutura plana como uma folha de papel localizada nas profundezas do cérebro, em ambos os lados. Olhado de frente, ele tem mais ou menos a forma dos Estados Unidos. Esse claustrum mantém conexões ativas com a maioria das outras partes do cérebro (necessárias para qualquer papel condutor). Ele também tem um tipo de neurônio que lhe é interno, capaz de despertar junto com outros de seu tipo e disparar sincronizadamente. Esta pode ser a maneira do claustrum de criar coerência a partir da cacofonia informacional que passa através dele. Porque a consciência se sente coerente. Não se importe se seu cérebro está nesse momento processando um zilhão de bits diferentes de dados.
A teoria da consciência (global) de Gerald Edelman considera a consciência como resultado da atividade neuronal por todo o cérebro. Edelman (juntamente com Changeux e outros) aplica a teoria da evolução a populações de neurônios. Iniciando-se bem cedo no desenvolvimento do indivíduo, a ativação de neurônios e sua conexão com outros neurônios formam populações que se modificam à medida que interagem com inputs do meio ambiente. O sistema de recompensa do cérebro faz a mediação que determina que populações sobreviverão como as mais aptas. A teoria de Edelman cita o fato de que não existem dois cérebros exatamente iguais; mesmo gêmeos idênticos não têm cérebros idênticos.
Como é que, no esquema de Edelman, a consciência obtém sua coerência? Através da recirculação de sinais paralelos. Se v. é um neurônio, v. recebe um sinal, digamos, de uma onda de luz, então o retransmite para o próximo neurônio através de um pulso elétrico. Imagine fogos de artifício, uma explosão no céu noturno. Diferentes grupos de neurônios registram a luz, a forma, o estouro sonoro. Depois de receberem seus respectivos sinais, as populações de neurônios os repassam à frente e à retaguarda para outras populações de neurônios. O que emerge é uma gloriosa explosão estelar".