segunda-feira, 1 de março de 2010

Inteligência Geral II


A Teoria da Integração Parieto-Frontal (P-FIT) citada na primeira postagem é considerada a melhor resposta disponível para a questão da localização da inteligência no cérebro, conforme a última parte da tradução abaixo. Vindo da Nature Reviews Neuroscience, a teoria está bem abonada.

Sua principal formulação foi publicada em 2007:
(60) Jung, R. E. & Haier, R. J. The Parieto-Frontal Integration Theory (P-FIT) of intelligence: converging neuroimaging evidence. Behav. Brain Sci. 30, 135–154; discussion 154–187 (2007). A detailed review of structural neuroimaging correlates of intelligence supporting the conclusion that, in addition to frontal areas, a network of frontal and posterior brain areas are involved in general cognitive functions (Uma revisão detalhada dos correlatos de neuroimagem estrutural da inteligência, sustentando a conclusão de que, além das áreas frontais, uma rede de áreas cerebrais frontais e posteriores estão envolvidas nas funções cognitivas gerais). Aqui.

O artigo abaixo, do qual traduzo uns trechos, é excelente. Vale a pena procurar ler sua versão integral (ainda não consegui uma versão livre na internet para colocar aqui).

Nature Reviews Neuroscience 11, 201-211 (March 2010) doi:10.1038/nrn2793
The neuroscience of human intelligence differences
Ian J. Deary, Lars Penke & Wendy Johnson
http://www.nature.com/nrn/journal/v11/n3/full/nrn2793.html (se v. tiver acesso)


Nesse artigo: Box 1 - Definições de inteligência

Uma definição antiga e aparentemente circular de inteligência veio do psicólogo americano E. G. Boring em 1923, quando ele afirmou: "A inteligência é aquilo que os testes testam". Ainda que essa definição seja frequentemente criticada por detratores dos testes de QI (quociente de inteligência), ela foi retirada de seu contexto. O comentário aparentemente pejorativo vem depois de um resumo de sólidos achados empíricos - por exemplo, como os testes revelaram marcantes diferenças individuais, que essas diferenças permaneciam estáveis com o decorrer do tempo, que as crianças desenvolviam maior inteligência no decorrer do tempo, mas tendiam a manter seu lugar na mesma ordem de classificação.

A sentença que vem logo depois da famosa citação foi que a definição reconhecidamente escorregadia "é o único ponto de partida para uma rigorosa discussão dos testes". Boring simplesmente estava dizendo que os dados psicométricos tinham que ser bons, e depois ligados a outras evidências sobre as origens e os resultados da inteligência.

Uma definição mais ampla foi convencionada por 52 proeminentes pesquisadores sobre inteligência: "A inteligência é uma capacidade bastante geral que, entre outras coisas, envolve a habilidade para racionar, planejar, resolver problemas, pensar abstratamente, compreender idéias complexas, aprender rapidamente e aprender através da experiência. Não é apenas aprender através de livros, uma limitada habilidade acadêmica, esperteza em fazer testes. Ao invés, reflete uma capacidade mais ampla e mais profunda de compreender nossos arredores - 'inteirar-se', 'tirar sentido' das coisas, ou 'ter uma idéia' sobre o que fazer. A inteligência, assim definida, pode ser mensurada, e os testes de inteligência medem-na corretamente".

Os testes de inteligência geralmente consistem ou de tarefas complexas que envolvem diferentes aspectos do raciocínio, como as Ravens Progressive Matrices, ou baterias de tarefas que exigem diferentes tipos de desempenho cognitivo, como fornecer definições de palavras ou visualizar objetos tridimensionais a partir de diagramas bidimensionais. Duas propriedades desses tipos de teste são importantes. Em primeiro lugar, todos os testes de inteligência - sejam tarefas unitárias, simples, ou tarefas complexas, multifacetadas - estão correlacionados e tendem a gerar um forte fator geral quando aplicados a uma grande amostra de pessoas. Em segundo lugar, qualquer que seja sua definição, a inteligência deve ser estimada por sua validade enquanto constructo, querendo dizer as evidências acumuladas de que os testes medem alguma coisa que tem relevância: evidências sobre resultados práticos de diferenças de inteligência, consistência de estrutura psicométrica e relações com estruturas e processos biológicos. Por esse critério, a inteligência é uma faceta fundamental e válida das diferenças individuais entre os seres humanos. Como demonstra esse artigo, independentemente da definição e do teste usados os dados de imagem cerebral e de estudos genéticos mostram fortes correlações com os resultados de testes de inteligência. Isso dá validade a medidas psicométricas de inteligência, ao contrário das críticas de que tais resultados de testes (quase sempre expressados como QIs) são números sem significado.

Nesse artigo: Teoria da integração parieto-frontal da inteligência (Parieto-frontal integration theory of intelligence - P-FIT)
(Nota: veja as BAs - áreas de Brodmann - na figura acima)

De acordo com essa P-FIT, o córtex extrastriado (BAs 18-19) e o giro fusiforme (BA 37) estão envolvidos no desempenho em um teste de inteligência porque contribuem no reconhecimento, na formação de imagem e na elaboração do input visual, assim como faz a área de Werbicke (BA 22) quanto ao input auditivo sintático. As informações apreendidas através dessas vias são então processadas nos giros supramarghinal (BA 40), parietal superior (BA 7) e angular (BA 39), nos quais acredita-se que surjam o simbolismo estrutural, a abstração e a elaboração. Essas regiões parietais podem então interagir com partes do lobo frontal (especialmente as BAs 6, 9, 10, 45, 46 e 47) para formar uma rede de memória de trabalho que compara as diferentes soluções possíveis da tarefa. Uma vez que uma solução seja selecionada, o córtex singulado anterior (BA 32) sustenta o engajamento dessa solução e a inibição e a inibição de soluções alternativas. Estas interações entre as regiões do cérebro são dependentes da fibras de matéria branca que as conectam, como o fascículo arcuado. Para a maior parte dessas regiões do cérebro, o hemisfério esquerdo parece ser mais importante para o desempenho de tarefas cognitivas do que o direito. Como estudos subsequentes (61, 62) e também estudos que utilizaram diferentes metodologias (ver abaixo) geralmente confirmaram essa teoria (mas veja também a ref. 63), a P-FIT pode ser considerada como a melhor resposta disponível para a questão sobre a localização da inteligência no cérebro.