quarta-feira, 23 de junho de 2010

Múltiplos universos explicariam nossa seta do tempo?

Essas encucações cosmológicas também são cognição, informação processada. Nossa concepção do mundo (Weltanschauung), ainda que não pensemos muito nela, é parte importante de nossa particularidade: provavelmente é parte das motivações que nos levam a agir/reagir em situações conexas. Leia e pense nisso...

Artigo: O tempo e o multiverso. Múltiplos universos poderiam explicar nossa seta do tempo? O tempo decorre em sentido inverso em outros universos?

Time and the Multiverse. Could multiple universes explain our arrow of time? Does time run backwards in other universes?
Miriam Frankel 2010

You must remember this, a kiss is just a kiss, a sigh is just a sigh. The fundamental things apply, as time goes by...



Para muitos de nós, esta canção do filme Casablanca evoca lembranças românticas. Mas para Laura Mersini-Houghton, ela pode provocar questões mais profundas sobre os fundamentos da realidade: por que nos lembramos apenas do passado, e não do futuro? E qual é a origem da seta do tempo? Sua conclusão é que a seta do tempo não é tão fundamental como podemos acreditar.

A opinião de Mersini-Houghton sobre o tempo surge da visão de uma figura mais ampla - a maior figura possível, em verdade. Com a ajuda de uma verba de $50.000 da FQXi, ela está investigando a possibilidade de que nosso universo seja apenas um de muitos de um 'multiverso' de universos, e também o que isso significa com relação à seta do tempo.

Do Útero à Sepultura

Nós viajamos através da vida do útero até a sepultura, e não vice-versa, e ainda assim os cientistas não têm uma explicação real para o fluxo do tempo em uma só direção. As leis microscópicas que estão na base do comportamento das partículas não têm essa seta, funcionando igualmente bem para frente e para trás. Então, por que o tempo não corre para trás?

Os físicos quase sempre explicam a seta do tempo utilizando o conceito de entropia crescente - uma meida da desordem em um sistema. O universo se desenvolve de um início altamente ordenado, de baixa entropia, até um estado progressivamente mais desordenado, definindo a seta do tempo. Desse modo, os cubos de açúcar mergulhados no café se dissolvem à medida que o tempo passa, aumentando a desordem do sistema café-açúcar; mas eles não se re-solidificam. Para Mersini-Houghton, física da University of North Carolina, Chapel Hill, entretanto, este raciocínio simplesmente desperta a seguinte questão: por que, em primeiro lugar, o universo começou em um estado altamente improvável de baixa entropia?

A visão do multiverso oferece uma resposta simples: se existe um número infinito de cosmos, faria sentido que pelo menos alguns universos iniciassem em estado de baixa entropia. Mersini-Houghton primeiramente se interessou pela idéia com o advento da paisagem da teoria das cordas. Em 2003, os teóricos das cordas começaram a compreender que suas equações ofereciam surpreendentes 10.500 soluções igualmente válidas, cada uma das quais poderia descrever um universo possível. Repentinamente, conversava-se sobre uma paisagem de cordas - um multiverso de multiversos, cada um deles com leis físicas diferentes.

Essa paisagem fornece a base para o modelo de Mersini-Houghton. Cada novo universo se forma nessa paisagem como uma bolha, com alguma energia de vácuo intrínseca - similar em suas características à energia escura que faz com que o universo atual se expanda a uma taxa sempre crescente - que a leva a se inflar. Ao mesmo tempo, a matéria faz com que a bolha tente se esmagar em involução (crunch back down). 'É esse cabo-de-guerra que determina se um universos pode nascer ou não', diz ela.

De modo crucial, nesse modelo apenas as bolhas de alta energia sobrepujarão o esmagamento da matéria e se desenvolverão em universos completos. Essas bolhas teriam iniciado com entropia baixa, explicando as condições iniciais aparentemente improváveis do nosso universo.Um tempo sem seta?

Mersini-Houghton afirma que o tempo do multiverso mais amplo não tem seta, não favorecendo qualquer direção especial. Mas enquanto as leis físicas de cada universo em formação herdam essa simetria temporal, as próprias bolhas não recebem esse legado. Isto porque no momento de seu nascimento a bolha perde informações sobre o multiverso. A perda de informações resulta numa desordem crescente, diz ela. Em outras palavras, a entropia começa a aumentar na bolha, criando uma seta local do tempo.

A atração do multiverso?

Para descrever a evolução dinâmica da bolha, Mersini-Houghton utiliza uma equação quantico-mecânica dominante. 'É importante derivar tudo de uma teoria existente, fundamental', ela explica. Mas isso tem um preço: como não existe uma teoria corrente que ligue a mecânica quântica à relatividade geral, Mersini-Houghton supõe que as leis da mecânica sejam mais fundamentais que as da relatividade geral. Entretanto, nem todos os cosmologistas acham que o papel da relatividade geral possa ser subestimado. Sean Carroll, do Caltech, Pasadena, também está investigando independentemente a questão do tempo em um multiverso, mas, em contraste, está usando uma abordagem semiclássica de gravidade quântica. Seu modelo também contém um multiverso pai, sem uma seta geral do tempo.

'Você começa com um espaço-tempo que não tem direcionalidade temporal, o que faz sentido já que as leis físicas básicas são assim', diz Carroll. Em seu modelo, os universos bebês começam preferencialmente am baixa entropia. Uma vez crescidos, cada universo pode eventualmente dar à luz novos universos, o que ocorre devido às flutuações quânticas em presença da energia do vácuo. Esses universos têm setas do tempo apontando para diferentes direções, e assim, em alguns universos, o tempo pode realmente correr para trás.O decurso do tempo para trás é menos problemático para a mente do que parece, diz Carroll de modo confortante. Naquilo que chamamos de passado, existem universos nos quais, do nosso ponto de vista, a entropia está crescendo na direção do passado. Mas do mesmo modo, do ponto de vista deles, a entropia está crescendo na direção do futuro e estamos no passado deles. 'Tudo é completamente simétrico', diz ele. 'O antes está na visão do observador'.

Tudo isto soa bem em teoria. Mas dado que estamos fechados em nosso universo, será que há possibilidade de testarmos algum dia se um multiverso existe, e além disso, que ele possa ter uma seta do tempo? Mersini-Houghton acha que sim. Em seu modelo, os universos bebês mantêm uma vaga influência gravitacional uns sobre os outros, mesmo depois de perderem informações sobre o multiverso. Em 2006, ela predisse que essa linha cruzada fantasmagórica iria resultar em um 'empuxo' (
CLM - usei 'atração' anteriormente) nos clusters (grupos) de galáxias em uma parte do céu. No ano passado esse efeito - chamado de 'fluxo escuro' - surpreendentemente foi observado pela NASA. Não há consenso sobre o que ocasiona esse fluxo, Mersini-Houghton está animada. 'Nunca pensei que veria tal coisa, pelo menos não durante minha vida'.

Mersini-Houghton também predisse que um universo vizinho poderia criar um gigantesco vazio no espaço ao nos abalroar, repelindo gravidade e matéria. Alguns meses depois, a descoberta de um tal vazio com a utilização de rádio-telescópios da Very Long Baseline Array, New Mexico, foi registrada. Mas esse resultado foi questionado depois, em 2009, quando astrofísicos da University of Michigan afirmaram que as evidências do vazio eram um erro estatístico. A despeito desse contratempo, Rüdiger Vaas, filósofo da ciência da University of Stuttgart, diz que uma das vantagens do modelo de Mersini-Houghton é que ele pode ser testado. 'Você pode derivar predições dele, é é possível fazer testes agora mesmo', diz ele. 'Ainda que atualmente não se possa dizer se ele é verdadeiro ou falso, parece muito promissor'.
Assim, será que as últimas predições de Mersini-Houghton vão passar no escrutínio? Só o tempo dirá...

No clima do tempo humano:

Sandy Denny - Who Knows Where the Time Goes




Across the evening sky all the birds are leaving

But how can they know it's time for them to go?
Before the winter fire, I will still be dreaming
I have no thought of time
For who knows where the time goes?
Who knows where the time goes?
Sad deserted shore, your fickle friends are leaving
Ah, but then you know it's time for them to go
But I will still be here, I have no thought of leaving
I do not count the time
For who knows where the time goes?
Who knows where the time goes?
And I am not alone while my love is near me
I know it will be so until it's time to go
So come the storms of winter and then the birds in spring again
I have no fear of time
For who knows how my love grows?
And who knows where the time goes?
http://spoonercentral.com/RS/WhoKnows.mp3