Wojciech Zurek, físico polonês, investiga questões fundamentais que surgem nas interpretações padronizadas da mecânica quântica: O mundo objetivo desaparece quando ninguém está olhando? Falando nisso, quando é que o mundo se torna 'objetivo'? Por que não experimentamos a incerteza quântica na vida diária? O que ativa a diferença entre o quântico e o clássico? Ele acha que sua teoria do darwinismo quântico pode explicar.
Zurek conheceu o importante físico John Wheeler quando foi fazer seu doutorado em Austin, no Texas, e esse contato despertou sua atenção para diversos enigmas relativos a uma realidade estável. Abaixo, vou traduzir uns excertos das interessantes idéias de Zurek para que o leitor se anime a ler o artigo completo.
The Evolution of Reality. How natural selection could explain one of the biggest conundrums of quantum mechanics: The emergence of objective reality.
by Anil Ananthaswamy
November 10, 2009
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Acima de tudo, Zurek e Wheeler tinham dúvidas sobre uma das principais questões que incomodam a mecânica quântica: Como é que uma realidade objetiva emerge do mundo quântico? Uma das principais distinções entre um objeto quântico e um objeto clássico é que o primeiro pode existir em uma superposição de diferentes estados. Por exemplo, um elétron pode estar em dois lugares ao mesmo tempo. Mas esta superposição só perdura enquanto não olhamos para o objeto, ou o medimos. Uma vez que fizermos isso, ele volta imediatamente ao estado único.
Realidade Emergente
Como é que tal objeto quântico se torna clássico, escolhendo apenas um estado definitivo? A questão incomoda os físicos desde o surgimento da mecânica quântica, o colapso da função de onda e os universos paraleos sendo invocados como explicações alternativas. Mas nenhum dos dois conseguiu explicar o mecanismo real através do qual a realidade clássica emerge, ou como e porque a transformação é ativada por observações.
Pode parecer um problema esotérico, mas o crescente interesse em computação quântica lhe conferiu imediatividade. A superposição está no cerne da promessa da computação quântica. A idéia é que como os sistemas quânticos, à semelhança dos elétrons, podem existir em uma superposição de estados, eles podem codificar uma superposição de possibilidades e, portanto, executar uma superposição de computações simultaneamente. Em um computador clássico, a presença ou a ausência de um elétron pode codificar um '0' ou um '1'; em um computador quântico, a superposição poderia representar os dois simultaneamente. Isto significa que, em teoria, os computadores quânticos podem executar números exponencialmente maiores de cálculos usando o mesmo número de elétrons que o computador clássico.
Para que isso aconteça na prática, um computador quântico tem que manter sua superposição de estados por tempo suficiente para executar cálculos significativos. Mas isso é mais fácil de dizer do que fazer; está claro que o mundo que percebemos não existe em uma superposição de estados quânticos. Enquanto aqueles que constróem computadores quânticos procuram não destruir a superposição, os teóricos imaginam por que, em primeiro lugar, ela é destruida.
Aqui entra Zurek. Ele concentrou seus esforços na noção de decoerência, levantada prieiro por Dieter Zeh, da University of Heidelberg, em 1970. De acordo com a teoria da decoerência, um sistema quântico só pode permanecer em superposição de estados (isto é, permanecer coerente) à medida em que estiver isolado do meio ambiente. Assim que o meio ambiente - que inclui tudo, das moléculas do ar aos fótons - entra na figura, a coerência sai pela janela.
A (teoria da) decoerência argumenta que a razão pela qual não vemos objetos macroscópicos em uma superposição de estados quânticos é porque eles não podem ficar isolados de seu meio ambiente. Não é necessário um observador consciente efetuando uma medição para levar um objeto de um estado quântico para um estado clássico, basta uma pequena intervenção de suas cercanias.
A Sobrevivência do mais Apto
Mas isto ainda não explica quais objetos quânticos, efetivamente, se tornam clássicos. Foi aqui que Zurek fez sua contribuição mais importante, em trabalhos publicados de 1981 em diante. Sua argumentação enfatiza o papel do ambiente, que não perturba passivamente o objeto quântico. ao invés, ele determina ativamente qual realidade clássica será selecionada. 'O ambiente está monitorando o sistema. Não está apenas perturbando o sistema, está absorvendo informações'.
A questão principal é que os estados de superposição quântica não são criados igualmente - alguns são mais aptos para sobreviver em um ambiente particular do que outros. O ato de transferência de informação do sistema quântico para o ambiente serve a dois propósitos. Primeiro, ele destrói estados quânticos frágeis que não se ajustam muito bem a seus ambientes. Esta é a 'einselection' - a super-seleção induzida pelo ambiente (environment induced super-selection) - o processo que seleciona estes estados preferidos e dissemina as informações aobre eles através do ambiente.
Mas isso ainda não explica o surgimento da realidade objetiva. Afinal, esses estados quânticos super-selecionados ainda podem ser perturbados por uma medição direta executada por um observador.
As pesquisas atuais de Zurek se concentram na idéia de que o ambiente também se torna 'testemunha' do estado do sistema. Isso significa que múltiplas cópias dos estados que sobrevivem à interação com o ambiente se disseminam por todo o ambiente - como se este estivesse tirando fotografias dos estados preferidos e passando as mesmas adiante. Os estados-de-sobrevivência-do-mais-apto e sua proliferação por todo o ambiente foi chamado de darwinismo quântico (DQ).
O DQ assegura que diferentes observadores verão a mesma realidade objetiva porque, muito provavelmente, eles interceptarão uma cópia do mesm o estado estável. 'A idéia principal do darwinismo quântico é que quase nunca fazemos uma medição direta de nada', diz Zurek. Ao invés, o ambiente atua como testemunha, ou como canal de comunicação. 'É como um grande cartaz de publicidade, que deixa flutuar múltiplas cópias da informação sobre nosso universo por toda parte'.
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O próximo passo de Zurek é fazer outras previsões que possam ser testadas. Por exemplo, que fração do ambiente é necessária para se extrair uma certa quantidade de informação sobre o sistema quântico? Isto exige ampliar seu trabalho para incluir ambientes impuros. Até agora, os modelos teóricos envolveram ambientes puros idealizados, ou ''folhas em branco', nas quais apenas as informações sobre o sistema serão 'escritas'. Mas em casos realistas, a folha não está em branco - o ambiente pode já estar parcialmente ocupado por informações de outras entidades.
É claro que sempre existe o perigo de que o trabalho de uma vida seja minado pelos experimentos; Zurek esteve trabalhando em teorias de informação quântica por mais ou menos 30 anos. Muitas de suas teorias foram confirmadas por exeprimentos, mas o DQ ainda é novo e aguarda experimentos. Zurek, entretanto, está imperturbável. Afinal, enfrentar testes experimentais é essencial para qualquer teoria física que deseje ser levada a sério. Em um mundo cheio de idéias alternativas, apenas as mais aptas sobreviverão.