From Quarks To Mind: Is Our Existence Inevitable?
by Marcelo Gleiser
December 15, 2010
Olhe para as suas mãos. Nelas v. tem átomos que pertenceram a estrelas mortas há mais de cinco bilhões de anos. Essas estrelas, maiores do que o nosso Sol, forjaram boa prte da química da vida durante seus últimos momentos, antes de explodirem transformando-se em supernovas gigantes. Elas forjaram elementos químicos que se disseminam através do meio interestelar, reunindo-se aqui e ali em nuvens de hidrogênio que gravitavam em torno de si mesmas. Ocasionalmente essas nuvens tornaram-se instáveis com relação à sua própria gravidade e se contrairam. Essas nébulas condensadas deram surgimento às estrelas e aos planetas que as orbitam, trilhões de ambos apenas em nossa Via Láctea. Em pelo menos um desses planetas os elementos (químicos) se combinaram de maneiras incrivelmente complexas para criar organismos vivos. E dessas miríades de seres, um deles desenvolveu a mente, a capacidade de elaborar pensamentos complexos e de imaginar sobre suas origens.
Em sentido verdadeiramente real, nós somos pó estelar auto-consciente.
Espantosamente, tudo o que as estrelas tinham para começar era hidrogênio e gravidade. À medida que a gravidade comprimia o gás hidrogênio sob enormes pressões, o hidrogênio se fundia em hélio, subindo os primeiros degraus da escada química. Durante a maior parte de suas vidas as estrelas mantiveram esse processo de fusão em funcionamento. Quando começou a falta hidrogênio em seus núcleos, elas passaram a fundir hélio em carbono, e depois oxigênio e nitrogênio, e assim por diante até o urânio. É o que as estrelas fazem, elas elaboram elementos químicos.
Segundo a visão científica moderna, nós somos o que ocorre quando são dados alguns bilhões de anos ao hidrogênio e à gravidade.
Existem muitas lacunas a serem preenchidas nessa narrativa cósmica, e isto é o que torna a ciência emocionante. À medida que avançamos, aprendemos mais sobre o universo e nosso lugar nele. Talvez uma das questões mais controversas que surge dessa discussão seja acerca de nossa inevitabilidade. Será nossa existência uma consequência inevitável das leis da Natureza? Ou somos um acidente, e o cosmos poderia existir igualmente bem sem nós?
A posição científica 'dura' responderia que tudo o que podemos fazer é explicar o que medimos. Não há propósito ou plano, apenas o que acontece. E o que medimos conta uma história que começa pelo menos com os quarks (as partículas que formam os prótons e os neutrons), os elétrons e a radiação, finalizando alguns bilhões de anos mais tarde com a vida e os seres humanos. À medida que passamos do universo inicial habitado por quarks em um milionésimo de segundo após o Big Bang até o cosmos repleto de estrelas atual, não se discute que a matéria tenha ficado mais 'complexa', no sentido de que surgiram estruturas mais complicadas com a passagem do tempo. Não acho que ninguém em sã consciência discutiria que um cosmos habitado por uma sopa de partículas elementares é menos complexo do que outro habitado por estrelas, planetas e pessoas. Desse modo, vemos uma conexão entre a seta do tempo e o aumento de complexidade do mundo natural. Por que?
Antes de nos aventurarmos nessa estrada, devemos fazer uma pausa de um segundo e contemplar a beleza dessa realização. Nós humanos passamos a compreender, pelo menos em parte, este grande épico da criação, de suas origens até os dias de hoje. E aquilo que aprendemos fala de nossa profunda conexão com o cosmos, não só porque vivemos nele, mas porque somos feitos dele. Se somos partes de matéria estelar - como é qualquer outro agregado de matéria que existe no espaço - somos um com o cosmos: estamos no cosmos e ele está em nós.
Quem duvidar que a ciência seja uma empreitada profundamente espiritual deveria refletir sobre isso. As próprias reunião e teorização de dados concretos, que é uma das marcas registradas da ciência e que forma a maior parte das atividades diárias de um cientista, são parte da empreitada. Alguns podem parar por aí e não olhar à sua volta, e está tudo bem. Mas se v. der um passo atrás e levantar a cabeça, a verdade torna-se óbvia para quem quiser ver: a ciência responde à mesma necessidade espiritual de significado que nos tem acompanhado desde a aurora da humanidade.
Assim, se voltarmos à nossa existência e indagarmos se somos inevitáveis, o que podemos dizer? Sim, existe um óbvio aumento de complexidade quando se passa dos quarks à mente. E sim, poderia existir por aí um princípio oculto explicando porque isso ocorre. Mas poderia ter sido de outro modo, poderia o universo, particularmente a vida na Terra, se desenvolver sem que existíssemos? Pelo que sabemos até agora, a resposta honesta é sim. Se observarmos pelo menos a maneira como a vida se desenvolveu aqui, veremos a contingência desempenhando um grande papel: modifique este ou aquele evento cósmico e a vida teria se dado de outra maneira. Os dinossauros estiveram por aqui durante 150 milhões de anos, e estavam indo bem até que uma grande rocha caiu do céu e os matou. Antes dos dinossauros, durante os primeiros três bilhões de anos, a vida existia em sua maior parte sob a forma de bactérias. Assim, é difícil afirmar com confiança que exista um imperativo para que a vida inteligente complexa exista no universo. (Ainda que muita gente faça isso). Por outro lado, mesmo se não acharmos que existe um imperativo com relação à nossa existência, estamos aqui, produtos de 13,7 bilhões de anos de evolução cósmica. E isso é um fato.
Como v. responde essa pergunta diz muito sobre quem v. é e sobre aquilo em que v. acredita. Se você acha que existe algum tipo de teleologia cósmica, um sentido de propósito que inevitavelmente leva à vida, v. está dizendo que somos inevitáveis. Se não, se v. disser que somos resultado de uma série de acidentes cósmicos, então v. acredita que não somos inevitáveis. Nós apenas acontecemos. Esta última posição é frequentemente acusada de ser niilista: se formos o resultado de acidentes, qual é o sentido de estar vivo?
Bem, como atualmente nos falta um princípio que explique nossa inevitabilidade, eu argumentaria que precisamente por sermos resultado de acidentes nós somos muito importantes. Não temos que ser resultados de um grande plano para termos um sentido de propósito. Indo além, eu afirmaria que nosso propósito vem de nossa raridade, do fato de que pelo menos até onde saibamos nós somos os únicos seres capazes de pensar sobre nossa própria existência. Assim, o ponto principal de sermos o resultado de um acidente e de estarmos vivos e sermos inteligentes é a celebrar e proteger aquilo que nos tornou possíveis: nosso universo e nosso planeta. Até encontrarmos um princío que explique nossa inevitabilidade cósmica, isto já me fornece o bastante para trabalhar.