quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Gustav Mahler - Sinfonia No. 5

O assunto é a Sinfonia nº 5 de Mahler, com a Filarmônica de Viena regida por Claudio Abbado. No site já referido aqui (05.10.2008), Sic Transit Opera Mundi. Os cinco movimentos (que cabem em apenas um CD) são:
01. Trauermarsch (In gemessenem Schritt. Streng. Wie ein Kondukt - Plötzlich schneller. Leidenschaftlich. Wild - Tempo I)
02. Stürmisch bewegt. Mit größter Vehemenz - Bedeutend langsamer - Tempo I subito
03. Scherzo (Kräftig, nicht zu schnell)
04. Adagietto (Sehr langsam)
05. Rondo-Finale (Allegro)

Tradução de comentários cheios de sanidade feitos por Janet E. Bedell, jornalista e crítica musical de Baltimore, em 2007:
“Os cinco movimentos da sinfonia estão agrupados em uma estrutura mais ampla de três seções. Os movimentos 01 e 02, obsecados com a morte e que compartilham bastante do mesmo material temático, formam a Parte I. A parte II é o Scherzo, o movimento mais longo da obra. A parte III compreende o Adagietto como introdução lenta e o Rondo-Finale.
O movimento 01 é uma marcha fúnebre – um dos tropos favoritos de Mahler (NT – tropo é uma intercalação de fragmentos em melodias; as 'citações' de uma música dentro de outra, por exemplo, são tropos) – no sombrio tom de Do sustenido menor; suas diversas seções estão ligadas pela incendiária fanfarra de trompete-solo que faz a abertura. Após a fanfarra, as cordas em baixo registro introduzem o tema principal, um lamento estóico por sobre o fio abafado do cortejo. Quando a fanfarra volta pela terceira vez, é imediatamente engolfada por uma explosão selvagem de agonia que vem dos violinos na primeira seção do Trio. Mais tarde um segundo Trio faz uma abordagem emocional diferente, com música bem vienense e consoladora nas cordas. Mas aqui também chega-se a um clímax de dor que Mahler chama de Klagend (Lamentação). A música afunda em exaustão enquanto uma frágil flauta sussurra a fanfarra.
Marcado como 'Stürmisch bewegt' – 'com movimento tempestuoso' – o movimento 02 é o raivoso desenvolvimento dos temas e das emoções amplamente sob controle na marcha. As cordas abrem em um paroxismo selvagem de tristeza, sobrecarregadas por uma luta harmônica e rítmica que parece uma intensificação da música do primeiro Trio da marcha. Então os cellos introduzem um estado de espírito contrastante, um maravilhoso tema alongado que expande a música consoladora do segundo Trio da marcha. Por cima deles, madeiras em tom alto tremem e gritam um importante motivo: um soluçante salto melódico de nona caindo de volta para a oitava. Esses temas e estados de espírito batalham pelo controle até que um exaltado coral de metais no brilhante tom de Re maior parece proclamar o triunfo. Mas é cedo demais, e a música logo bruxuleia em gritos das madeiras.
A sinfonia agora passa por uma mudança esquizofrênica de estado de espírito, da tragédia para a comédia. Este despreocupado Scherzo dançante em Re maior – a meta harmônica da sinfonia – foi a primeira música que Mahler criou para a obra, e retrata os prazeres pastorais descuidados de seu retiro em Maiernigg. A própria música do scherzo está no estilo da dança campesina austríaca conhecida como Ländler, mas sua ingenuidade entra em contradição com o sofisticado ritmo cruzado do compositor. É seguido por um primeiro Trio, uma voz de valsa vienense para as cordas, e um segundo Trio, no qual a trompa principal – que tem um importante papel solo durante todo esse movimento – cria uma música suave e onírica junto com as cordas e as madeiras. Procure ouvir a obsessiva passagem dos chamados da trompa e as respostas distantes como se viessem através de um vale da montanha. Cooke chama esse Scherzo de ‘a dança da vida, evocando toda a agitação de uma existência vital, em oposição à concentração na inevitabilidade da morte das marchas fúnebres’. Durante o restante da sinfonia, Mahler escolhe a vida ao invés da morte.
Na Parte II, o belo Adagietto para cordas e harpa serve como lenta introdução ao Finale. Quase sempre em excertos, sua beleza sensual fala por si mesma. Escrito no primeiro verão de seu casamento, ele é, se não uma canção de amor para Alma (NT – nome da esposa), certamente uma expressão da paz de seu retiro onde compunha. Sua música lembra a canção contemporânea de Rückert, 'Ich bin der Welt abhanden gekommen' ('Estou perdido para o mundo'), que termina com as palavras: 'Vivo sozinho em meu próprio paraíso, em meu amor, em minha canção'.
O ebuliente Rondo-Finale no novo tom de Re maior segue-se imediatamente. As madeiras solo introduzem uma coleção de temas semelhantes a canções folclóricas que irão impelir o movimento, e então as trompas desenvolvem o suave refrão do rondó. Nessa época, Mahler estava arrebatado pela feitiçaria contrapontística de J. S. Bach, e esse finale transborda em passagens de exuberante fugato. Quando as trompas e os violinos em baixo registro introduzem o tema da segunda seção do fugato, podemos não reconhecer imediatamente a música, mas as cordas logo a confirmam como o tema de saudade do Adagietto, agora mais veloz e dançante juntamente com o restante. Os temas são combinados em diversão contrapontística até que os metais proclamem em grande estilo um coral similar àquele prematuro do movimento 02. Agora é a hora certa de celebrar o triunfo da vida sobre a morte, quando a música irrompe para uma alegre conclusão”. (Original de Janet E. Bedell em www.bsomusic.org/res/multimedia/92807MahlerSymNo5.pdf).