Dutton morreu na semana passada, e a partir daí começaram a aparecer diversas histórias interessantes sobre sua vida e sua carreira. Sendo fã do homem, gostei imensamente de conhecer algumas dessas histórias. O próprio Dutton conta algumas delas em sua entrevista de fevereiro de 2009 na revista eletrônica Edge, sobre a qual já coloquei postagens aqui. É uma entrevista editada, e com introdução de Steven Pinker. Vou traduzir um trechinho do início, e recomendo a leitura da íntegra. Vejam também o vídeo que lá está.
A personalidade humana - incluindo aqueles aspectos dela que são imaginativos, expressivos e criativos - pede uma explicação darwiniana. Se formos tratar aspectos da personalidade como adaptações - incluindo a expressão estética - temos que fazê-lo em termos de três fatores.
O primeiro é o prazer: as artes nos dão um prazer direto. Um estudo inglês feito há alguns anos mostrou que seis por cento da vida ativa de um adulto inglês mediano são passados divertindo-se com ficções em filmes, peças de teatro e televisão. E isso não inclui livros de ficção - livros de terror, romances sobre aeroportos, alta literatura e assim por diante. Esse tipo de devoção temporal e sua recompensa prazerosa exige algum tipo de explicação.
Em segundo lugar vem a universalidade. O que tivemos nos últimos quarenta anos é uma ideologia da vida acadêmica, que vê as artes como elaboradas socialmente e portanto singulares a culturas locais. Chamo de ideologia porque não se discute isso: é simplesmente pressuposto na maioria dos discursos estéticos. Aliada a esta posição está a idéia de que raramente ou nunca podemos entender realmente as artes de outras culturas; do mesmo modo, as outras culturas não entendem nossas artes. Todos estão vivendo em seu mundo cultural socialmente construido e hermeticamente selado. (...)
E em terceiro lugar, temos que considerar a espontaneidade das artes - a maneira como surgem espontaneamente, começando nas experiências da infância, por todo o globo. Pense nas maneira como as crianças, quando têm mais ou menos três anos, podem se ocupar com faz-de-conta e manter os mundos imaginados em separado uns dos outros. Uma criança pequena brincando com seus ursinhos em uma mesinha de chá. Se v. derrubar uma xícara e derramar o chá de faz-de-conta que está nela, a criança não terá dificuldade em saber qual das três xícaras reencher. Em verdade, se v. a xícara errada, e insistir que essa foi a que derramou, a criança pode até cair em pranto. A criança então vai da mesinha de chá para a televisão e assite um desenho do Pernalonga, ou Vila Sésamo. Daí para ler um livro, enytrando em seu mundo de faz-de-conta, e depois jantar com mamãe e papai. Até uma criança de três anos pode manter esses mundos reais e ficionais distintos uns dos outros. Essa sofisticação intelectual espontânea - tente imaginar ensinar isso do nada a uma criança de três anos - é marca de uma adaptação evolutiva.
A personalidade humana - incluindo aqueles aspectos dela que são imaginativos, expressivos e criativos - pede uma explicação darwiniana. Se formos tratar aspectos da personalidade como adaptações - incluindo a expressão estética - temos que fazê-lo em termos de três fatores.
O primeiro é o prazer: as artes nos dão um prazer direto. Um estudo inglês feito há alguns anos mostrou que seis por cento da vida ativa de um adulto inglês mediano são passados divertindo-se com ficções em filmes, peças de teatro e televisão. E isso não inclui livros de ficção - livros de terror, romances sobre aeroportos, alta literatura e assim por diante. Esse tipo de devoção temporal e sua recompensa prazerosa exige algum tipo de explicação.
Em segundo lugar vem a universalidade. O que tivemos nos últimos quarenta anos é uma ideologia da vida acadêmica, que vê as artes como elaboradas socialmente e portanto singulares a culturas locais. Chamo de ideologia porque não se discute isso: é simplesmente pressuposto na maioria dos discursos estéticos. Aliada a esta posição está a idéia de que raramente ou nunca podemos entender realmente as artes de outras culturas; do mesmo modo, as outras culturas não entendem nossas artes. Todos estão vivendo em seu mundo cultural socialmente construido e hermeticamente selado. (...)
E em terceiro lugar, temos que considerar a espontaneidade das artes - a maneira como surgem espontaneamente, começando nas experiências da infância, por todo o globo. Pense nas maneira como as crianças, quando têm mais ou menos três anos, podem se ocupar com faz-de-conta e manter os mundos imaginados em separado uns dos outros. Uma criança pequena brincando com seus ursinhos em uma mesinha de chá. Se v. derrubar uma xícara e derramar o chá de faz-de-conta que está nela, a criança não terá dificuldade em saber qual das três xícaras reencher. Em verdade, se v. a xícara errada, e insistir que essa foi a que derramou, a criança pode até cair em pranto. A criança então vai da mesinha de chá para a televisão e assite um desenho do Pernalonga, ou Vila Sésamo. Daí para ler um livro, enytrando em seu mundo de faz-de-conta, e depois jantar com mamãe e papai. Até uma criança de três anos pode manter esses mundos reais e ficionais distintos uns dos outros. Essa sofisticação intelectual espontânea - tente imaginar ensinar isso do nada a uma criança de três anos - é marca de uma adaptação evolutiva.
Prazer, universalidade e desenvolvimento espontâneo. Vemos os três nas realidades interculturais da música, na universalidade do relato de histórias, assim como em coisas como gostos culinários, interesses eróticos, bichos de estimação, interesses esportivos, em nossa fascinação com a resolução de enigmas, nas fofocas - a lista é indefinidamente longa. Charles Darwin tem muito mais a dizer sobre como evoluimos enquanto animais sociais inventivos e expressivos, com nossas personalidades notáveis, do que lhe dão crédito. Esses aspectos da evolução têm profundas implicações para as origens e a evolução das artes.