segunda-feira, 19 de julho de 2010

A (força da) gravidade não existe


Como eu já disse: Essas encucações cosmológicas também são cognição, informação processada. Nossa concepção do mundo (Weltanschauung), ainda que não pensemos muito nela, é parte importante de nossa particularidade: provavelmente é parte das motivações que nos levam a agir/reagir em situações conexas. Leia e pense nisso...

O causo aqui é que o NY Times publicou um artigo prá lá de bom sobre a provável inexistência da gravidade. O assunto é tão esotérico que nem vou acrescentar nada, apenas traduzir uns trechos (quase tudo) para dar água na boca dos leitores. (Na foto, Erik Verlinde)


NY Times, July 12, 2010
A Scientist Takes On Gravity
By Dennis Overbye

É difícil imaginar um aspecto da vida na Terra mais fundamental e onipresente do que a gravidade, desde o momento em que damos o primeiro passo e acabamos de traseiro no chão, até a queda lenta e terminal da carne e dos sonhos.

Mas... e se tudo for uma ilusão, uma espécie de extravagância cósmica ou um efeito colateral de alguma coisa que está acontecendo em níveis mais profundos da realidade?

Assim diz Erik Verlinde, respeitado divulgador da teoria das cordas e professor de física na University of Amsterdam, cuja afirmativa de que a gravidade é mesmo uma ilusão causou interminável discussão entre os físicos, ou pelo menos entre aqueles que declaram saber do que ele está falando. Revertendo a lógica de 300 anos de ciência, ele argumenta em um artigo recente chamado “On the Origin of Gravity and the Laws of Newton” que a gravidade é uma consequência das veneráveis leis da termodinâmica, que descrevem o comportamento do calor e dos gases.

'Para mim, a gravidade não existe', disse o Dr. Verlinde, que esteve recentemente nos USA para explicar o que está defendendo. Não que ele não sofra quedas, mas o Dr. Verlinde está entre diversos físicos que dizem que a ciência tem olhado para a gravidade de maneira errada, e que existe algo mais básico do qual a gravidade 'emerge', como os mercados de capitais emergem a partir do comportamento coletivo de investidores individuais, ou como a elasticidade emerge da mecânica dos átomos.

Olhar a gravidade por este ângulo, dizem eles, poderia esclarecer algumas das desconfortantes questões cósmicas da atualidade, como a energia escura, um tipo de antigravidade que parece estar tornando a expansão do universo mais rápida, ou a matéria escura, que supostamente é necessária para manter as galáxias unidas.

A argumentação do Dr. Verlinde se vale de algo que poderia ser chamado de teoria 'dia do cabelo ruim' da gravidade. É mais ou menos assim: seu cabelo se eriça ao calor e à umidade, porque há mais maneiras do seu cabelo se enroscar do que ficar liso, e a natureza gosta de ter opções. Por isso é preciso que uma força deixe o cabelo liso e elimine as opções da natureza. Esqueça o espaço curvo ou aquela atração esotérica tão bem descrita pelas equações de Isaac Newton que nos permite navegar nos anéis de Saturno. A força que chamamos de gravidade é simplesmente um subproduto da propensão da natureza para maximizar a desordem.

Alguns dos melhores físicos do mundo dizem que não entendem o artigo do Dr. Verlinde, e muitos são totalmente céticos. Mas alguns desses mesmos físicos dizem que ele fornece uma nova perspectiva sobre algumas das questões mais profundas da ciência, isto é, por que existem espaço, tempo e gravidade, afinal de contas - ainda que ele não tenha dado esta resposta a elas. (...)

Você pode querer saber por que um físico da teoria das cordas está interessado nas equações de Newton. Afinal, Newton foi superado há um século por Einstein, que explicou a gravidade como sendo dobras na geometria do espaço-tempo, e que pode ser superado pelos teóricos das cordas, acreditam alguns físicos.

Nos últimos 30 anos, a gravidade vem sendo 'desnudada', nas palavras do Dr. Verlinde, enquanto força fundamental. Este desnudamento começou na década de 1970, com a descoberta de Jacob Bekenstein, da Hebrew University of Jerusalem, e Stephen Hawking, da Cambridge University, entre outros, de uma misteriosa conexão entre os buracos negros e a termodinâmica, culminando na descoberta de Hawking, em 1974, de que quando os efeitos quânticos forem levados em consideração, os buracos negros irão brilhar e eventualmente explodir. (CLM - não entendi muito bem a relação causal entre uma coisa e outra, mas é isso que está escrito).

Em um provocativo cálculo de 1995, Ted Jacobson, físico teórico da University of Maryland, demonstrou que, dadas algumas dessas idéias holográficas, as equações de Einstein para a relatividade geral são apenas outra maneira de afirmar as leis da termodinâmica. Os buracos negros que explodem (pelo menos em teoria - nenhum foi observado ainda) iluminam uma nova estranheza do mundo natural. Os buracos negros, efetivamente, são hologramas - como as imagens em 3D que v. vê em cartões de alguns bancos. Todas as informações sobre o que se perdeu no interior deles estão codificadas em suas superfícies. Os físicos, desde essa época, ficam imaginando como esse 'princípio holográfico' - de que somos todos meras sombras em uma parede distante - se aplica ao universo, e de onde ele surgiu.

Em um notável exemplo de um universo holográfico, Juan Maldacena, do Institute for Advanced Study (Institute for Advanced Study - School of Natural Sciences, Princeton) construiu um modelo matemático de um universo 'lata-de-sopa', onde o que ocorria dentro da lata, incluindo a gravidade, está codificado no rótulo do lado de fora da lata, onde não há gravidade, assim como existe uma dimensão espacial a menos. Se as dimensões não têm importância, e a gravidade não tem importância, o quanto elas podem ser reais?

Lee Smolin, físico teórico da gravidade quântica do Perimeter Institute for Theoretical Physics, disse que o estudo do Dr. Jacobson 'é um dos mais importantes dos últimos 20 anos'. Mas ele recebeu pouca atenção a princípio, disse Thanu Padmanabhan, do Inter-University Center for Astronomy and Astrophysics em Pune, India, que abordou a questão da 'gravidade emergente' em diversos trabalhos dos últimos anos. O Dr. Padmanabhan disse que a conexão com a termodinâmica vai mais fundo do que as equações de Einstein com relação a outras teorias da gravidade. 'A gravidade', disse ele numa palestra recente no Perimeter Institute, 'é o limite termodinâmico da mecânica estatística dos átomos do espaço-tempo'.

O Dr. Verlinde disse que leu o trabalho de Jacobson muitas vezes através dos anos, mas que ninguém parece ter entendido sua mensagem. As pessoas ainda estão falando da gravidade como uma força fundamental. 'Claramente, temos que levar essas analogias a sério, coisa que ninguém parece estar fazendo', reclamou ele. Seu estudo, postado no arquivo de física (CLM - http://arxiv.org/) em janeiro, se parece com o do Dr. Jacobson de muitas maneiras, mas o Dr. Verlinde se chateia quando as pessoas dizem que ele não acrescentou nada de novo à análise do Dr. Jacobson. Ele disse que aquilo que é novo é a idéia de que as diferenças em entropia podem ser o mecanismo ativo por trás da gravidade; e que a gravidade é, como ele nota, uma 'força entrópica'. (...)

Pense no universo como uma caixa de letras de scrabble. Existe apenas uma maneira de arrumar as letras para que elas transmitam o Gettysburg Address (CLM - famoso discurso de Abe Lincoln), mas um número astronômico de maneiras de arrumá-las sem transmitir sentido. Sacuda a caixa e ela tenderá para a ausência de sentido, a desordem irá aumentar e as informações se perderão à medida que as letras se dispõem em suas configurações mais prováveis. Poderia isto ser a gravidade?

Como metáfora do funcionamento disso, o Dr. Verlinde utilizou o exemplo de um polímero - uma cadeia de DNA, digamos, um fio de macarrão ou um cabelo - se enrolando. 'Levei dois meses para entender os polímeros', disse ele. O artigo resultante, admite ele, é um pouco vago. 'Isto não é a base de uma teoria', explicou. 'Não tenciono que isso seja uma teoria. As pessoas deveriam prestar atenção nas palavras que escrevi, não nos detalhes das equações'.

O Dr. Padmanabhan disse que viu pouca diferença entre os trabalhos do Dr. Verlinde e do Dr. Jacobson, e que o novo elemento de uma força entrópica não tinha rigor matemático. 'Duvido que estas idéias se sustentem com o teste do tempo', escreveu ele num e-mail da Índia.

Em uma oficina do Texas, na primavera, Raphael Bousso, da University of California, Berkeley, foi solicitado a liderar uma discussão sobre o trabalho. 'O resultado final foi que ninguém acabou entendendo também, incluindo as pessoas que achavam ter visto um sentido nele inicialmente', disse ele em mensagem por e-mail. 'De qualquer modo, o trabalho de Erik chamou a atenção para aquilo que é uma questão genuinamente profunda e importante, e isto é bom'. E prosseguiu: 'Não fazemos idéia de como isso funciona, depois do trabalho de Erik. Existem diversos trabalhos posteriores, mas à diferença de Erik, eles nem sabem qual é o problema'. (...)

Durante um almoço em NY, o Dr. Verlinde ruminou suas experiências dos últimos seis meses. Ele disse que simplesmente rendeu-se à intuição. 'Quando a idéia me ocorreu, fiquei bastante animado, até mesmo eufórico. Não é sempre que v. tem uma chance de dizer algo novo sobre as leis de Newton'. Ele disse que seusamigos o incentivaram a prosseguir, e que ele não se arrepende. 'Se ficar comprovado que eu estava errado, pelo menos alguma coisa foi aprendida. Isso é o bastante para se seguir adiante'.