terça-feira, 24 de novembro de 2009

A primazia da consciência

"Sem dúvida, a questão mais importante que um cientista ou um ser humano pode explorar é: como a massa de tecido cerebral pode gerar a experiência interior que chamamos de consciência, o estado a que ninguém mais tem acesso?" Esta foi Susan Greenberg, na Introdução de Neurochemistry of Consciousness, e sua maneira de raciocinar, diretamente materialista, é a regra geral hoje em dia: o cérebro, através de um processo ainda em discussão, "cria" a consciência. Michel Bitbol investiga:

Is Consciousness primary ? A Consciência é primária?
Michel Bitbol

CREA, CNRS / Ecole Polytechnique, 1, rue Descartes, 75005 Paris, France
NeuroQuantology, vol. 6, n°1, 53-72, 2008

Abstract/Resumo: São revistos seis argumentos contra a visão de que a experiência consciente deriva-se de uma base material. Estes argumentos vêm da epistemologia, fenomenologia, neuropsicologia e da filosofia da mecânica quântica. Ocorre que qualquer tentativa de provar que a experiência consciente é ontologicamente secundária a objetos materiais não só é mal sucedida como faz surgir sua primazia metodológica e existencial. Nenhuma visão metafísica alternativa é escolhida (nem mesmo uma variação da teoria do duplo aspecto, de Spinoza). Ao invés, uma instância alternativa, inspirada pela neurofenomenologia de F. Varela, é defendida. Essa instância pouco conhecida envolve (1) uma redefinição completa da fronteira entre suposições inquestionadas e questões relevantes; (2) uma ida até o terreno comum das afirmações da fenomenologia e da ciência natural objetiva: uma prática motivada pela procura de um círculo em expansão de concordância intersubjetiva.

Introdução
A visão de acordo com a qual a consciência se deriva de uma base material (que ela é, por assim dizer, secundária a aranjos especiais de entidades materiais) termina por ser mais débil do que se acredita correntemente. Tentarei mostrar que essas credenciais científicas e filosóficas, na verdade, são bastante discutíveis. Mas ao final, não tentarei endossar qualquer visão metafísica alternativa como "a consciência é alguma coisa auto-existente que independe da matéria" ou "consciência e matéria são aspectos de alguma coisa básica comum", que não seriam mais fáceis de defender do que seus opostos. Em linha com Francisco Varela, vou ao invés advogar uma mudança radical de posição quanto a objetividade e subjetividade.

Como preparação, deixe-me circunscrever o que tendemos a querer dizer com "consciência", tomada como a experiência imediata, mais do que como auto-percepção. Para transmitir um sabor desse significado pouco comum da palavra, a maneira rápida é parafrasear a afirmativa de Wittgenstein sobre as sensações "(A consciência) não é alguma coisa, mas também não é nenhuma coisa!" A consciência não é alguma coisa. Se queremos entender essa curta e enigmática afirmativa, temos que fazer um inventário das "coisas" que somos capazes de indicar por meio da linguagem.

Na p. 16, Bitbol vai logo arrematando: "Neste ponto, estamos quase chegando à nossa conclusão. A consciência é existencialmente, transcendentalmente e metodologicamente primária. Qualquer tentativa de demonstrar como ela pode ser ontologicamente secundária a objetos materiais não só fracassa como nos leva de volta à sua primazia metodológica".

Acontece que depois de apresentar o programa da "posição vareliana, ou neurofenomenológica", Bitbol batuca essas abobrinhas:

"Claramente, este programa elaborado como um conjunto de prescrições, mais do que de afirmações teóricas, não resolve o "difícil problema" da origem física da experiência consciente. Entretanto, a razão para esta não-solução não é que o problema seja muito difícil, mas que na posição apropriada ele nem surge. Não surge porque o mundo físico não é mais o padrão do ser, e a objetividade não é mais o padrão definitivo do método. Na posição alternativa, o padrão do ser apoia-se num padrão de auto-evidência, e o padrão metodollógico de objetividade expande-se até um padrão mais geral de intersubjetividade.Então, da mesma maneira como, para Wittgenstein, "A solução do problema da vida é vista no desaparecimento do problema", de acordo com Varela, a solução do difícil problema da consciência encontra-se em uma certa posição e em um certo programa de pesquisa onde o problema desaparece".

Se o assunto chacoalha sua massa cinzenta, leia o restante em:
http://philsci-archive.pitt.edu/archive/00004007/

Neurochemistry of Consciousness: Neurotransmitters in Mind
Elaine K. Perry, Heather Ashton, Allan H. Young
Foreword by Susan Greenberg

2002 344 pages PDF 2,4 Mb
http://depositfiles.com/files/2089371