quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Pensamentos e Células de Glia, Astrócitos

As raízes do pensamento: O que fazem as células de glia?
Quase 90% do cérebro são compostos de células de glia, e não neurônios. Andrew Koob argumenta que essas células esquecidas podem ser a fonte da imaginação.
October 27, 2009
by Andrew Koob

Andrew Koob received his Ph.D. in neuroscience from Purdue University in 2005, and has held research positions at Dartmouth College, the University of California, San Diego, and the University of Munich, Germany. He's also the author of The Root of Thought, which explores the purpose and function of glial cells, the most abundant cell type in the brain. Mind Matters editor Jonah Lehrer chats with Koob about why glia have been overlooked for centuries, and how new experiments with glial cells shed light on some of the most mysterious aspects of the mind.

LEHRER: Seu novo livro, The Root of Thought, é dedicado aos poder das células de glia, que chegam a 90% das células do cérebro. O que fazem as células de glia? E por que temos tantas em nossas cabeças?
KOOB: Originalmente, os cientistas achavam que elas não faziam nada. Até os últimos 20 anos, os neurocientistas achavam que os neurônios se comunicavam representando nosso pensamento, e que as glias eram uma espécie de estuque que mantinha a casa em pé. Eram consideradas meras insuladoras para a comunicação dos neurônios. Existem alguns poucos tipos de células de glia, mas recentemente os cientistas começaram a se concentrar em um tipo particular de célula de glia chamado de 'astrócito', já que são abundantes no córtex. É interessante: se v. vem subindo na escala evolutiva, os astrócitos do córtex aumentam em tamanho e número, sendo que os humanos têm a maior quantidade de astrócitos, e também os maiores. Os cientistas também descobriram que os astrócitos se comunicam no córtex e são capazes de enviar informações aos neurônios. Finalmente, os astrócitos também são a célula tronco (stem cell) adulta do cérebro e controlam o fluxo sanguíneo nas regiões onde há atividade cerebral. Por causa de todas essas importantes propriedades, e já que acredita-se que o córtex é responsável pelo pensamento superior, os cientistas começaram a compreender que os astrócitos podem contribuir para o pensamento.
LEHRER: Por que as glias foram negligenciadas por tanto tempo?
KOOB: Para entender isso, temos que fazer uma turnê através da história da neurociência. Durante 200 anos, as células de glia foram quase sempre um objeto menor nas discussões sobre a idéia do neurônio. Alguns acontecimentos importantes foram: no final do século 18, os cientistas descobriram as propriedades elétricas do neurônio na espinha dorsal de sapos. Os neurônios têm longas extensões, de fácil estudo, chamadas 'axônios', que se estendem do corpo celular do cérebro até a espinha dorsal e dela para os membros e para o corpo, Similarmente, os neurônios dos sentidos estavam ligados aos neurônios do cérebro. É aqui onde se fundamenta a idéia de que os neurônios são a base de nossos pensamentos. Em meados do século 19, as glias estavam aepnas sendo descobertas e os pesquisadores achavam que elas simplesmente mantinham os neurônios juntos (glia é a palavra grega para cola). O que eu acho engraçado é que os cientistas se depararam com células muito numerosas do cérebro, um órgão responsável por nossos pensamentos e por nossa personalidade, mas estavam tão concentrados nos neurônios que concluiram que a nova célula não tinha valor. Ao final do século 19, desenvolveu-se um método de pigmentação para se observar melhor as células cerebrais. Um brilhante pesquisador espanhol, Santiago Ramon y Cajal, resolveu estudar o cérebro a partir da perspectiva dos neurônios. Ele mapeou meticulosamente um esquema de como eles processam informações e estão conectados, o que levou à 'Doutrina Neuronal' (A doutrina do neurônio é a crença de que os neurônios são responsáveis por nossos pensamentos). Entretanto, Cajal parecia se incomodar com as células de glia, Elas eram muito numerosas e visivelmente estavam por todo o córtex. Entrementes, seu irmão Pedro, que também era cientista, desenvolveu a teoria de que as glias eram 'células de apoio' que insulavam as propriedades elétricas dos neurõnios. Cajal decidiu apoiar a teoria de seu irmão. E desde 1906, quando ele ganhou o prêmio Nobel, este tem sido o dogma.
LEHRER: Você poderia descrever alguns dos experimentos iniciais que pela primeira vez levaram os cientistas a reconsiderar o papel das células de glia?
KOOB: Os experimentos com as glias só se disseminaram na década de 1960. Tudo o que os cientistas sabiam sobre as glias é que se v. pusesse neurônios num recipiente de Petri, teria que colocar glias, ou então os neurônios morriam. Então, Stephen W. Kuffler, de Harvard, por razões desconhecidas, resolveu testar a teoria de Pedro. Isso ocorreu mais ou menos na época em que foi revelado, em contagens de células, que as células de glia eram 90% do cérebro (é daí que vem a idéia de que usamos apenas 10% do nosso cérebro). Kuffler é notável porque ironicamente ele estabeleceu o departamento de 'neuro'biologia de Harvard enquanto fazia esses inovadores experimentos com as glias. De qualquer modo, Kuffler tirou os astrócitos das sanguessugas e das salamandras e acrescentou potássio, que reconhecidamente flui dos neurônios após serem estimulados. Ele achou que isso confirmaria a teoria de Pedro de que as células de glia eram insuladores. O que descobriu, ao invés, foi que o potencial elétrico das células de glia reagia ao potássio. Kuffler e colegas descobriram que os astrócitos apresentavam um potencial elétrico, muito parecido com o dos neurônios. Eles também descobriram na rã e na sanguessuga que os astrócitos eram influenciados pela troca neuronal de íons, um processo que há muito se acreditava ser a contrapartida química do pensamento. Desde então, muitos pesquisadores completaram experimentos sobre a habilidade de comunicação das células de glia com os neurônios, inclusive no final da década de 80 e no início da década de 90, quando se descobriu que as células de glia reagem e liberam 'neuro'transmissores.
LEHRER: Por que as ondas de cálcio são importantes?
KOOB: Resumindo, as ondas de cálcio são a maneira pela qual os astrócitos se comunicam entre eles. Os astrócitos têm centenas de 'perninhas' que projetam de seu corpor. Parecem pequenos polvos, e ligam essas perninhas a vasos sanguíneos, outros astrócitos e sinapses neuronais. O cálcio é liberado de armazenamentos internos dos astrócitos à medida que são estimulados, e então o cálcio passa por suas perninhas até os outros astrócitos. O termo 'ondas de cálcio' descreve a liberação de cálcio e a troca entre astrócitos e entre astrócitos e neurônios. Cientistas de Yale, notavelmente Ann H. Cornell-Bell e Steven Finkbeiner, demonstraram que as ondas de cálcio podem se espalhar desde o ponto de estimulação de um astrócito até todos os outros astrócitos de uma área centenas de vezes o tamanho do astrócito original. Além disso, as ondas de cálcio também fazem com que os neurônios disparem. E as ondas de cálcio do córtex estão levando os cientistas a inferir que esse estilo de comunicação pode levar ao processamento de certos pensamentos. Se isto não for convincente, recentemente demonstrou-se que uma molécula que estimula os mesmos receptores que o THC pode ativar a liberação de cálcio do astrócito.
LEHRER: Você está sugerindo que as glias e suas ondas de cálcio podem desempenhar um papel na criatividade. Poderia explicar isso?
KOOB: Essa idéia vem dos sonhos, da privação sensorial e do devaneio (day dreaming). Sem input de nossos sentidos através dos neurônios, como é que temos pensamentos tão vívidos? Como é que quando estamos imersos em pensamentos parecemos desligar tudo do ambiente que está à nossa volta? Nessa teoria, os neurônios estão ligados à nossa ação muscular e aos nossos sentidos externos. Sabemos que os astrócitos monitoram os neurônios à procura dessas informações. Similarmente, podem induzir os neurônios a disparar. Portanto, os astrócitos modulam o comportamento dos neurônios. Isso significaria que as ondas de cálcio dos astrócitos são nossa mente pensando. A atividade neuronal sem o processamento dos astrócitos é um simples reflexo; qualquer coisa mais complicada poderia requerer processamento pelos astrócitos. O fato de que os humanos tem maiores e mais abundantes astrócitos do que qualquer animal e que somos capazes de criatividade e imaginação também dá credibilidade a essa especulação.O cálcio também é liberado aleatoriamente e sem estimulação dos armazenamentos internos dos astrócitos em pequenas rajadas chamadas de 'puffs'. Esses puffs aleatórios podem levar às ondas. É possível que os pensamentos aparentemente aleatórios durante a experiência dos sonhos e da pricação sensorial poderiam ser puffs de cálcio tornando-se ondas em nossos astrócitos. Basicamente, é óbvio que os astrócitos estão envolvidos no processamento cerebral do córtex, mas as principais questões são: os nossos pensamentos e nossa imaginação vêm do trabalho conjunto de astrócitos e neurônios, ou nossos pensamentos e nossa imaginação são unicamente domínio dos astrócitos? Talvez o papel dos neurônios seja dar apoio aos astrócitos."

Coloquei essa porque é legalzinha, mas no Google Images têm outras representando a onda de cálcio.

Nota: Essas especulações todas do artigo são o fino, mas esse assunto não é novo. Veja, por exemplo, Antanitus, D., A Theory of Cortical Neuron-Astrocyte Interaction (1998), citando bibliografia de 1990 e redondezas. Em http://www.antanitus.com/hypothesis . Esse artiguinho, por sinal, tem uma figura (3) dividida em quatro partes, e cada uma dessas partes aparece consecutivamente, 'animando' a descrição contida em cada um dos itens. Todas as figuras descrevendo processos deveriam ser assim...