Na Enciclopédia Britânica de 1911, a consciência está definida assim: “(Do latim con-scientia, literalmente ‘conhecimento de uma coisa compartilhado com outra pessoa’ ou ‘conhecimento completo’, e derivativamente ‘consciência’ em geral), um termo filosófico usado tanto popular como tecnicamente em muitos sentidos diferentes para aquela faculdade mental que decide entre o certo e o errado. No uso popular, a ‘consciência’ é entendida em geral como aquilo que intuitivamente fornece decisões quanto à qualidade moral de ações isoladas. Esse uso supõe implicitamente que toda ação tem uma correção ou incorreção (o bem ou o mal) objetiva ou intrínseca, que a ‘consciência’ discerne mais ou menos do mesmo modo que os olhos vêem e as orelhas ouvem”. O glossário de termos filosóficos do Departamento de Filosofia da University of Hong Kong também não vai muito longe: “Uma explicação filosófica do que é a consciência ou como ela poderia ser explicada nos escapa. Se nos detivermos no que é um ser humano consciente, não temos explicação; se tentamos explicar consciência em termos do que ocorre em nosso cérebro, o próprio sentido da consciência é deixado de lado”.
Em A Consciência e seu Lugar na Natureza (2003), diz David J. Chalmers: “A consciência se encaixa mal em nossa concepção do mundo natural. Na concepção mais comum de natureza, o mundo natural é o mundo físico. Mas na concepção mais comum de consciência, não é fácil ver-se como ela poderia ser parte do mundo físico. Parece então que para encontrarmos um lugar para a consciência na ordem natural, precisamos revisar nossa concepção de consciência, ou revisar nossa concepção de natureza” (em http://consc.net/papers/nature.pdf ). Chalmers tem um site (http://consc.net/online ) com 5386 artigos ou estudos “sobre consciência em filosofia e em ciência, e tópicos relacionados da filosofia da mente”. Depois de ler os 5386 artigos, leia também Consciousness as Recursive, Spatiotemporal Self-Location (A consciência como uma autolocalização espaçotemporal recursiva), de Frederic Peters (University of Queens, Austrália). Aqui está o Resumo/Abstract do artigo para abrir seu apetite:
“No nível fenomênico, a consciência pode ser descrita como um campo singular e unificado de auto-percepção (self-awareness) consistentemente coerente de maneira particular; aquela de um sujeito localizado tanto espacial como temporalmente em um domínio egocentricamente estendido de modo que a auto-percepção consciente está explicitamente caracterizada pela eu-dade (I-ness), pela agora-dade (now-ness) e pela aqui-dade (now-ness). O mecanismo psicológico que subsidia essa autolocalização espaçotemporal e seu estilo recursivo de processamento envolve uma elaboração evolutiva do quadro de referência orientacional básico que estrutura harmoniosamente as contínuas computações de auto-localização espaçotemporal como eu-aqui-agora. A cognição computa o output de ação no interior de um movimento continuado, e conseqüentemente requer um quadro de referência espaçotemporal de auto-localização constante como base para essas computações. Com o tempo, as constantes pressões evolutivas por eficiência energética encorajaram tanto a proliferação de mecanismos antecipatórios de processamento como a elaboração, no ápice da hierarquia de processamento sonsóriomotor, de um circuito auto-ativador recursivamente antecipatório altamente atenuado processando o esquema orientacional básico independente de output da ação externa. Enquanto quadro primário de referência da cognição ativa do estado de alerta, esse processamento recursivo do eu-aqui-agora gera uma região de auto-percepção subjetiva em termos da qual há o sentido de ser si mesmo aqui e agora. Isto é a consciência”.
Não se deixe abater. O texto do próprio artigo é bem menos hermético. Por exemplo (p. 2): “O mistério aparentemente intratável da consciência tem uma explicação mais simples e mais imediata, com raízes na incompletude da atual teoria neuropsicológica. O problema de explicar as propriedades da experiência fenomênica em termos psicológicos (e em última análise, biofísicos) encontra paralelo, como sugere Antii Revonsuo, no enigma encontrado pela ciência há um século, quando tentava explicar a relação da química com a física e da biologia com a química. Em ambas as instâncias, a descontituidade entre as propriedades se dissolveram à medida que os cientistas passaram a entender cada nível de organização com mais precisão – o papel dos elétrons na física atômica, suficiente para explicar as ligações químicas, e o papel das macromoléculas e das complexas vias bioquímicas de feedback, suficientes para se explicar a atividade biológica.
Similarmente, a aparente descontinuidade entre as propriedades fenomênicas da consciência e os processos psiconeurológicos empiricamente demonstrados provavelmente se deriva de uma compreensão incompleta dos mecanismos de processamento cognitivo, por um lado, juntamente com uma análise insuficientemente precisa das propriedades fenomênicas da consciência, por outro lado. De acordo com isso, a explicação da consciência como auto-localização recursiva vai alinhar as características fenomênicas básicas da consciência (auto-percepção consistente enquanto sujeito localizado aqui e agora) com um constructo cognitivo específico (o esquema auto-localizacional) processado de maneira particular recursivamente antecipatória”.