sábado, 18 de abril de 2009

Modularidade: primeiro mapeamento global

Paul Laurienti (1), Christina Hugenschmidt (1) e Satoru Hayasaka (2) fizeram o primeiro mapeamento da modularidade cerebral que não restringe as análises a estruturas anatômicas prédefinidas, focalizando o fenômeno por toda a extensão do funcionamento do cérebro.
1. Wake Forest University School of Medicine, Radiology
2. Wake Forest University School of Medicine, Public Health Science and Radiology

Mapas de modularidade revelam estrutura comunitária do cérebro humano em repouso é o nome do artigo de Laurienti e colegas, publicado ontem nos Precedings da revista Nature. Já falamos de modularidade aqui, em 29 de junho e em 21 de setembro de 2008, sendo que o artigo de Elizabeth Bates (ardorosa defensora da modularidade) recebe agora uma importante comprovação experimental. Leia o abstract/resumo de Laurienti e colegas:

“O cérebro é uma rede complexa de neurônios interconectados que combina especificidade regional com processamento distribuido. Progressos recentes no campo da teoria de redes facilitaram análises pioneiras demonstrando que a conectividade cerebral exibe propriedades de pequeno-mundo similares às de outras redes auto-organizadas como a internet, o genoma, e até mesmo organizações sociais. A conectividade cerebral dá apoio ao processamento local e global através de grandes conglomerados (high clustering) e de vias curtas de conectividade, respectivamente. Na mesma medida em que esses índices de rede abrangente enfatizam a organização global da rede, a especificidade regional está relacionada à interconectividade de regiões vizinhas locais dentro do sistema como um todo (global). O trabalho apresentado aqui avaliou a estrutura comunitária de redes do cérebro humano em repouso para identificar as regiões vizinhas locais e mapear aquelas áreas interconectadas relativamente ao cérebro. O estudo identificou um predizível aglomerado nos córtices unisensoriais. Entretanto, a inesperada estrutura comunitária da rede de modo default (DMN – default-mode network) revelou três módulos distintos e incluiu os córtices frontais laterais às tradicionais regiões DMN. Esses resultados são os primeiros a mapear a modularidade por todo o cérebro sem restringir as análises a estruturas anatômicas prédefinidas. Tais análises fornecem uma visão imparcial das comunidades de rede e prometem nos trazer novas idéias sobre a organização do cérebro. A avaliação da estrutura modular do cérebro em todos os seus estados, durante tarefas exigentes ou em populações de doentes irá revelar modificações dinâmicas de conectividade em redes cerebrais globais”.

Modularity maps reveal community structure in the resting human brain é o nome do artigo de Laurienti e colegas, e esse mesmo link traz o endereço da versão PDF do artigo completo.

Linguística Cognitiva

O livro é Cognitive Linguistics: Basic Readings, editado por Dirk Geeraerts. O que são essas leituras básicas do título? Diz DG:

“As teorias, em linguística, tendem a ser assuntos bastante delimitados: cada compartimento teórico procura constituir uma entidade conceitual e sociológica própria, com apenas um número limitado de pontes, praças de mercado ou mesmo campos de batalha compartilhados com outras abordagens. A Linguística Cognitiva, quando considerada à luz dessa metáfora, toma a forma de um arquipélago, mais do que de uma ilha. Não se trata de um grande território claramente delimitado, mas sim de um conglomerado de centros mais ou menos extensos e mais ou menos ativos de pesquisa linguística que estão estreitamente ligados por uma perspectiva da qual compartilham, mas que não estão (ainda) reunidos sob o regulamento comum de uma teoria bem definida. O presente volume contém uma introdução às doze partes fundamentais desse conglomerado teórico – uma viagem pelas doze ilhas centrais, se você preferir: Gramática Cognitiva, construal gramatical, rede radial, teoria do protótipo, rede esquemática, metáfora conceitual, esquema de imagem, metonímia, espaços mentais, gramática de construção e linguística baseada no uso”.

Cognitive Linguistics: Basic Readings
2006 PDF 485 pgs Edit. Mouton de Gruyter
http://depositfiles.com/files/9ildhk4vp

quinta-feira, 16 de abril de 2009

A Mente Fenomenológica

Shaun Gallagher e Dan Zahavi lançaram (em 2008) A Mente Fenomenológica: Uma Introdução à Filosofia da Mente e à Ciência Cognitiva. Já divulguei aqui um artigo de Gallagher (em julho de 2008), que foi bem aceito. Pelo pouco que pude apreender, pois só consegui esse link ontem, este novo livro é um texto sério e interessante: veja o primeiro parágrafo da Introdução, abaixo.

“Este é um livro sobre a mente. O que é a mente e como ela funciona é atualmente um tópico de muitos debates complexos que se valem de inúmeras disciplinas: psicologia, neurociência, inteligência artificial, filosofia da mente – disciplinas que geralmente são tratadas como ciências cognitivas. A natureza interdisciplinar desses debates não é coincidência. Mais do que isso, é necessária por não haver uma disciplina única que faça justiça à complexidade das questões envolvidas. Nesse trabalho, queremos explorar diversas questões que tradicionalmente foram estudadas por filósofos da mente. Entretanto, não pretendemos assumir uma abordagem puramente filosófica – isto é, não adotamos uma abordagem filosófica que ignore as outras ciências. Frequentemente nos valeremos dos detalhes de evidências científicas de estudos de neurociência cognitiva e de imagem cerebral, psicologia cognitiva e do desenvolvimento, e de psicopatologia. No entanto, este é um livro sobre filosofia da mente, e ainda que seja muito interdisciplinar, continua sendo uma tentativa de tratar de problemas filosóficos”.


Shaun Gallagher é Professor e Chair of Philosophy and Cognitive Sciences da University of Central Florida, e Research Professor of Philosophy and Cognitive Science da University of Hertfordshire (UK). É autor de How the Body Shapes the Mind (2005) e co-editor de Does Consciousness Cause Behavior? An Investigation of the Nature of Volition (2006).

Dan Zahavi é Professor of Philosophy e diretor do Center for Subjectivity Research da University of Copenhagen. É autor de Subjectivity and Selfhood (2006) e Husserl’s Phenomenology (2003).

The Phenomenological Mind: An Introduction to Philosophy of Mind and Cognitive Science Editora: Routledge 2008 PDF 244 pages
http://depositfiles.com/files/akq63pp59

Acompanha bem: Phenomenological Epistemology, de Henry Pietersma
2000 224 pgs PDF
http://rapidshare.com/files/117443792/0195131908_-_Henry_Pietersma_-_Phenomenological_Epistemology_-_Oxford_University_Press__USA.pdf

Verdi: Requiem e Quatro Peças Sacras, etc.

Messa da Requiem e Quattro Pezzi Sacri (Ave Maria, Stabat Mater, Laude alla Vergine Maria e Te Deum) de Verdi, sendo os intérpretes: Anne Sofie von Otter, Luca Canonici, Luba Orgonasova, Alastair Miles, Orchestre Révolutionnaire et Romantique, o Monteverdi Choir e Donna Brown (Te Deum). Regente: John Eliot Gardiner. Pode ir de olhos vendados. A dica é do site http://pqpbach.opensadorselvagem.org/ onde estão os links para download. Aproveite que está por lá, e grave também dezesseis Lieder de Schubert com Barbara Hendricks e Radu Lupu. Dispensa adjetivos. Em seguida, Maurizio Pollini (Berliner Philharmoniker e Abbado) em dois concertos: Schumann (A minor, Op. 54) e Brahms (D minor, Op. 15). Pronto: ganhou o dia...

domingo, 12 de abril de 2009

Paul Ricoeur sobre Freud

Em 1965, a casa Éditions du Seuil (Paris) publicou De L’Interprétation – Essai sur Freud, de Paul Ricoeur. “Antes de tudo, este livro é dedicado a Freud, e não à psicanálise”, diz Ricoeur, e justifica: “Nele faltarão duas coisas: a própria experiência analítica e uma apreciação das escolas pósfreudianas”. Ele aborda a obra de Freud “como um monumento de nossa cultura, um texto no qual nossa cultura está expressada e compreendida” (p. xi). No próprio título do primeiro capítulo, Linguagem, Símbolo e Interpretação, Ricoeur indica seus pontos básicos de abordagem. A linguagem é o fator unificante: “Parece-me que atualmente há uma área na qual coincidem todas as investigações filosóficas: a da linguagem. Ela é o terreno comum das investigações de Wittgenstein, da filosofia linguística inglesa, da fenomenologia surgida através de Husserl, dos estudos de Heidegger, das obras da escola de Bultmann e de outras escolas da exegese do Novo Testamento, dos trabalhos de história comparada das religiões e da antropologia que tratam do mito, do ritual e da crença e, afinal, da psicanálise”.

A complexidade é impressionante, e ainda estamos no primeiro ponto de abordagem. A passagem para diante se dá através da hermenêutica, e Paul Ricoeur escolhe a obra Traumdeutung (A Interpretação dos Sonhos, de 1900) como referência: “...a entrada da psicanálise no debate contemporâneo sobre a linguagem não se deve apenas à sua interpretação da cultura. Fazendo dos sonhos não apenas seu primeiro objeto de investigação, mas também um modelo de todas as expressões disfarçadas, substitutivas e fictícias das aspirações e do desejo humano, Freud nos convida a buscar nos próprios sonhos as diversas articulações entre desejo e linguagem. Em primeiro lugar, não é o sonho, ao ser sonhado, que pode ser interpretado, mas sim o texto do relato do sonho; a análise tenta substituir esse texto por outro, que poderia ser chamado de fala primitiva do desejo. Assim, a análise se move de um significado para outro significado: não são os desejos enquanto tais que estão situados no centro da análise, mas antes sua linguagem”.

Esta cadeia desejo - sonho - relato, que cria o que Ricoeur chama de “campo hermenêutico”, será des-velada (como gostam de expressar os admiradores de Heidegger) pela interpretação, e aqui ele introduz a definição: “Por hermenêutica entenderemos sempre as regras que presidem uma exegese, quer dizer, a interpretação de um texto singular ou de um grupo de signos que possa ser visto como um texto”. Estamos no terreno da semiótica (que é dicionarizada como ‘semântica’ e que procede do grego semeiotikos, observador de signos – ou sinais – e verbaliza ação com semeioun, sinalizar, interpretar como signo – ou sinal). Ricoeur então entrecruza seus outros dois pontos básicos de abordagem, o símbolo e a interpretação (“... é por intermédio do ato de interpretar que o problema do símbolo se inscreve em uma filosofia da linguagem” p. 8), deixando claro na próxima seção do texto, Para uma crítica do símbolo, que distingue sua concepção de símbolo da concepção que dele faz a lógica simbólica. Não deixe de excursionar pela vereda aberta por Ernst Cassirer (que deve a hemoglobina de seu sangue a Kant) e que está brevemente indicada na p. 10. Ricoeur está com os pés no chão ao comentar a Filosofia das Formas Simbólicas, de Cassirer: “(Cassirer) foi o primeiro a chamar a atenção para o problema da reconstrução da linguagem. A noção de forma simbólica, mais do que constituir uma resposta, delimita uma questão, a saber, a questão da composição das ‘funções mediadoras’ no interior de uma função única que Cassirer intitula das Symbolische. ‘O simbólico’ designa um denominador comum de todas as maneiras de objetivar, de dar significado à realidade”.

Só mais uma coisa. Ricoeur pergunta: “Mas por que chamar essa função de simbólica?”. Explica ele: “Acima de tudo, Cassirer escolheu esse termo para expressar a universalidade da revolução copernicana, que substituiu a questão da objetivação através da função sintética da mente pela questão da realidade como ela é em si mesma. O simbólico é a mediação universal da mente entre nós mesmos e o real; acima de tudo, o simbólico indica o caráter não imediato de nossa apreensão da realidade. O uso do termo em matemática, linguística e na história da religião parece confirmar que o ‘simbólico’ tem essa espécie de universalidade”. Agora o leitor está solto nesse torvelinho ( o millwheeling vicociclometer, de James Joyce), e precisa ler a íntegra do livro de Ricoeur.


Freud and Philosophy – An Essay on Interpretation, de Paul Ricoeur.
Yale University Press, 1970
http://rapidshare.com/files/42927426/Paul_Ricoeur-Freud_and_Philosophy-_An_Essay_on_Interpretation__The_Terry_Lectures_Series_.pdf

Pode ser uma boa

Origem da Mente: Cérebro, Cognição e Inteligência, livro de David C. Geary, pode ser uma boa escolha. Nunca ouvi falar de Geary, não gostei das generalidades mal redigidas (abobrinhas) da editoria (ver abaixo), e o assunto se presta a mais uma comprovação do dito “Há sempre um chinelo velho para um pé doente”. Mas, quem sabe?

“Darwin achava que a compreensão da evolução da mente e do cérebro humanos era de capital importância para as ciências evolutivas. Este livro pioneiro estabelece uma teoria abrangente e integrada de como e porque a mente humana se desenvolveu para funcionar como funciona. Geary propõe que os sistemas motivacional, afetivo, comportamental e cognitivo humanos se desenvolveram para processar informações sociais e ecológicas (por exemplo, expressões faciais) que covariavam com opções de sobrevivência ou de reprodução durante a evolução humana. Além disso, ele argumenta que o foco definitivo de todos esses sistemas é dar apoio às nossas tentativas de acessar e controlar recursos – mais especificamente, sociais (por exemplo, companheiros[as]), biológicos (por exemplo, alimento) e físicos (por exemplo, território) – que dão apoio à sobrevivência e à reprodução bem sucedidas com o decorrer do tempo. Sob esse ponto de vista, a conceitualização darwiniana de seleção natural como ‘luta pela existência’ se torna, para nós, uma luta com outros seres humanos pelo controle dos recursos disponíveis. Esta luta fornece meios para integrar sistemas modulares cerebrais e cognitivos, como a linguagem, com aqueles sistemas cerebrais e cognitivos que dão apoio à inteligência em geral. Para defender seus argumentos, Geary se vale de uma quantidade impressionante de achados recentes em ciência cognitiva e neurociência, assim como em primatologia, antropologia e sociologia. O livro também explora diversas questões que interessam à sociedade moderna, incluindo como a inteligência em geral se relaciona com a realização acadêmica, o status ocupacional e a renda. Os leitores verão que esse livro é uma leitura que vai despertar outras questões e que também dá impulso a novas teorias da mente”.

Origin of Mind: Evolution of Brain, Cognition, and General Intelligence, de David C. Geary Publisher: American Psychological Association (APA) 2004 459 Pgs
Em http://depositfiles.com/files/46oykbguy